Introdução
Construir um entendimento mais profundo a respeito do sistema linear predominante hoje ajudará a identificar suas lacunas. Para evitar simplesmente remendar um sistema falho, é essencial imaginar algo diferente: um futuro circular regenerativo desde o design.
Assim como acontece com os sistemas, uma visão de futuro circular pode abranger diferentes escopos. É possível imaginar algo tão complexo quanto uma indústria, região, cidade ou organização. De forma semelhante, pode ser útil imaginar como um produto, linha ou tecnologia poderia ser em um cenário futuro no qual os princípios da economia circular sejam prioridade.
Quando as pessoas são convidadas a imaginar e experimentar um determinado aspecto da economia circular, as barreiras se dissolvem. Cenários imaginados podem ser usados como um terreno comum entre pessoas de diferentes setores e formações. Dessa forma, futuros circulares revelam perguntas não respondidas, caminhos que podem ser explorados e novas colaborações. O processo imaginativo acelera a descoberta de oportunidades que um futuro circular apresenta, e ajuda as pessoas a pensar de forma criativa sobre o papel que podem desempenhar no caminho para chegar lá. Assim, essa é uma etapa poderosa para conseguir a adesão de atores estratégicos em sua organização ou cadeia de valor.
“Definir o que tem valor para uma organização é de fato o ponto de partida. O que buscamos? O que as organizações buscam está estreitamente relacionado com a forma como entendemos valor e o que possui ‘valor’.”
Joanna Choukeir, diretora de design e inovação, The RSA
“Valor vai além de valor econômico, dinheiro, margens de lucro. Você precisa redefinir o valor de uma empresa se quiser promover uma revolução em sua organização e pensar na forma com que vai conduzir sua empresa em direção ao design circular.”
Anne Asensio, vice-presidente de design experience, Dassault Systèmes
Transformar um futuro circular em uma possibilidade real e cativante também é uma forma de confrontar ou provocar as pessoas em relação às características da transição de linear para circular. Experiências e artefatos funcionam como catalisadores de decisões, obrigando as pessoas a refletir sobre os resultados esperados e indesejáveis e as compensações e conflitos que podem acontecer.
“Existem muitos incentivos e externalidades conflitantes que atrapalham a mudança para uma economia circular – nós precisamos ter uma visão do todo e ajudar as pessoas a se orientarem em direção a esse futuro a partir de seu ponto de partida.”
Joanna Choukeir, diretora de design e inovação, The RSA
Esse exercício de imaginação também pode despertar novas perguntas. Projetar cenários futuros nos incentiva a questionar como uma indústria, uma cidade, uma empresa ou um produto podem funcionar de acordo com os princípios de uma economia circular. Podemos perguntar como um projeto pode ampliar seus impactos positivos, seja em termos de escala, replicabilidade ou adaptação a diferentes contextos.
“Temos desafiado cidades e desenvolvedores, proprietários de construções e empresas a observarem seu edifício, fábrica, bloco, empreendimento, ou mesmo sua cidade inteira, e então perguntamos: como você pode redesenhar esses espaços de forma que eles se tornem produtores líquidos de serviços ecossistêmicos? Ouvimos falar de energia líquida positiva… mas, se você quiser ser biomimético, precisa funcionar como o ecossistema vizinho.”
Quando renovamos algo a partir do status quo – por exemplo, tornando um produto 10% mais eficiente –, temos a experiência de esforços anteriores como guia. Quando adentramos um cenário desconhecido, inovando a partir de princípios fundamentalmente diferentes – por exemplo, alugando um produto em vez de vendê-lo, estimulando os usuários a consertar seus produtos ou selecionando ingredientes de fontes regenerativas – a incerteza pode ser assustadora.
Produtos e serviços projetados para uma economia circular são baseados em princípios e estratégias diferentes e podem desencadear novos comportamentos ou desafiar os padrões estabelecidos. Podem ser pouco familiares. Então, do ponto de vista mais prático, interagir com uma invenção imaginada ajuda os profissionais a explorar e refinar seus conceitos, oferecendo insights que muitos dados – provavelmente derivados de práticas estabelecidas na economia linear – jamais seriam capazes de proporcionar. Quando o caminho é ambíguo ou incerto, uma visão compartilhada cria um ponto de referência ou um norte ao qual se pode voltar para esclarecer as ideias. Ela também pode oferecer mais clareza sobre os próximos passos ou ações necessárias para realinhar o rumo em direção ao futuro.
A imaginação é uma habilidade humana universal. Seja de forma intencional ou por instinto, estamos constantemente imaginando diferentes caminhos e resultados, o que nos ajuda a tomar decisões com base em como nos sentimos em relação a esses potenciais futuros. Principalmente quando uma organização está elaborando sua estratégia de economia circular, as equipes de design podem usar, aliadas aos dados, abordagens como design especulativo, prototipagem, design de experiências e visualização criativa para dar forma aos futuros cenários imaginários – para fazer com que pareçam reais. A partir daí, podemos ampliar a magnitude das dimensões prática, emocional e financeira e de fato ensaiar o que significaria operar nesses cenários alternativos.
Como proceder
Imagine um futuro circular desejável
Use métodos de visualização com um grupo de atores para imaginar um futuro sistema ou ecossistema que incorpore os princípios da economia circular – eliminar, circular e regenerar. Oriente os participantes a pensar de forma aberta e transformadora, ultrapassando a atual realidade linear, para imaginar um futuro desejável que vá além de nós mesmos – ou seja, um futuro para as futuras gerações e outras espécies de seres vivos. Perguntas que começam com “E se” são úteis para estimular nossa imaginação e abrir possibilidades, como demonstra Rob Hopkins ao imaginar a cidade de Londres (Reino Unido) como um Parque Nacional.
“Viemos de um contexto em que as empresas perguntavam ‘até onde podemos ir sem consequências?’. Depois, passamos a perguntar ‘ok, o que precisamos fazer?’. Agora, o que as empresas precisam se perguntar é ‘o quanto podemos fazer para retribuir?’”
Kate Raworth, economista e cofundadora do Doughnut Economics Action Lab
Ellen MacArthur Foundation Summit 22, Session one: Shifting mindsets - a regenerative future (5th July 2022)
Apresente esse futuro
Explore coletivamente o que há de transformador nesses cenários de economia circular, observando em particular como o sistema funciona em diferentes escalas (floresta, rua, bairro, cidade) e para cada indivíduo e organização. Use métodos criativos para apresentar e debater as bases desse futuro, assim como os princípios e valores que vão orientar a transformação. É importante que haja um senso compartilhado de missão ou propósito para além das pessoas que lideram a iniciativa.
“Os designers precisam dar vida às visões de economia circular de uma forma que normalmente não acontece. Essas visões precisam ser emocionantes e cativantes.”
Chris Grantham, IDEO Alum (ex-diretor executivo de economia circular)
“Os designers têm uma mente criativa e são bons contadores de histórias – por meio de narrativas e visualizações, eles podem ajudar a mobilizar outras pessoas a agirem.”
Jamie Bates, líder global de design, Unilever
Questione e teste o conceito
Faça as perguntas necessárias, considerando o que pode ser preciso para mudar o sistema atual e deixá-lo mais próximo do desejado. Precisamos produzir mais coisas novas para resolver o problema? O que deixaria de ter função nesse sistema circular? Quais facilitadores precisam entrar em ação? Como o design precisa evoluir para criar lugares regenerativos, circulares e habitáveis para todos? Que atores precisam trabalhar juntos para que isso aconteça? E como suas funções vão mudar à medida que suas ambições e metas também mudarem?